Portal de Conferências da UnB, VI Encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo

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DESAFIOS LATINO-AMERICANOS: ARQUITETURA, CRÍTICA E HISTORIOGRAFIA
Monica Junqueira Camargo, Ivo Giroto

Última alteração: 2020-08-19

Resumo


A criação dos Seminários de Arquitetura Latino-Americana (SAL), em 1985, estabeleceu, no âmbito da cultura arquitetônica, um maior contato com os países da América Latina, especialmente entre o Brasil e os países da américa espanhola, até então com poucas trocas entre os críticos e historiadores. A partir de então, e sobretudo nas últimas décadas, o intercâmbio tem se intensificado com convênios e projetos comuns.

Em 2008 foi criado o Observatório de Arquitetura Latino-Americana Contemporânea (ODALC), um projeto trinacional entre Colômbia, Brasil e México, reunindo professores e pesquisadores da Universidad Nacional de Colombia – sede Bogotá, da Universidad Autónoma Metropolitana – Unidad Xochimilco e da Universidade de São Paulo. O ODALC nasceu do desejo de consolidar grupos de pesquisas institucionais permanentes, dissolver fronteiras entre os países participantes, promovendo o intercâmbio entre programas de ensino e de investigação científica, com a participação dos docentes e de pesquisadores de diversos níveis – da iniciação científica ao pós-doutorado. O projeto tem um componente aplicado - inventariar a arquitetura do século 21 - e um componente teórico - desenvolver um instrumental teórico-crítico para avaliação dos projetos, cujo objetivo é propor e desenvolver teorias e métodos que estimulem o conhecimento local dos processos históricos e historiográficos da arquitetura e da cidade latino-americana para uma melhor compreensão do seu papel no cenário mundial, contribuindo para uma revisão da historiografia da arquitetura.

Os panoramas da arquitetura do século 20 escritos por historiadores europeus e norte-americanos têm dado pouca atenção à contribuição latino-americana. Em mais de vinte manuais (CAMARGO, 2006, p. 66) escritos a partir de 1933 por Alberto Sartoris, a 2013 por Jean-Louis Cohen, a maioria das menções se concentram na arquitetura moderna brasileira sintetizada nas obras de Oscar Niemeyer, consideradas mais como prova da influência de Le Corbusier mundo afora, do que pela própria inovação por ele introduzida. CURTIS (2008), especialmente a segunda edição, e COHEN (2013) se dedicaram com um pouco mais de interesse à produção latino-americana sendo, portanto, não só oportuna, mas necessária uma revisão historiográfica a partir de uma análise local, como a proposta por Marina Waissman desde a década de 1960, quando colaboradora da revista Summa.

O ODALC nasceu dessa preocupação e a partir das diretrizes estabelecidas de comum acordo entre os participantes, o projeto foi trabalhado pelo núcleo de docentes das três universidades, cada qual adequando-o segundo sua estrutura curricular, em disciplinas de graduação e pós-graduação, em grupos e laboratórios de pesquisas, bem como foi tema de seminários promovidos para o levantamento da produção arquitetônica recente e das questões da crítica e da historiografia.

A base dos trabalhos constituiu de uma bibliografia comum sobre crítica de arquitetura – ARANGO (2013); ARGAN (1988); ATTOE (1978); BAXANDALL (2006); CAMARGO (2011); COLLINS (1971); MONTANER (2007 e 2014); SAUNDERS (2007); SEGAWA (2013); SORKIN (2014); WAISMAN (1995 e 2013), e de uma ficha especialmente elaborada para o registro de cada uma das obras, trocada entre os vários parceiros do projeto visando a constituição de um acervo da produção contemporânea, que por sua vez deveria alimentar o exercício da crítica.

Nessa década de trabalho compartilhado, o levantamento das obras teve como recorte o século 21 e tipologias de uso coletivo e de acesso público, excluindo-se residências unifamiliares, edifícios comerciais e residenciais. Apesar da relevância dessas tipologias para as pesquisas e experimentações, sobretudo no contexto brasileiro, deu-se prioridade aos projetos de uso coletivo. O vasto conjunto de obras constituído tem sido a base das discussões entre os participantes, a partir do qual foram identificadas as principais questões relativas à arquitetura do século 21, cuja reflexão poderá contribuir, segundo WAISMAN (2013, p. 31), “para a tomada de consciência de situações e, no caso do crítico latino-americano, cumpre importante papel na tomada de consciência do significado que o tema examinado possa ter para nossa própria cultura ou nossa práxis profissional.”

O contato entre mais de uma dezena de pesquisadores das três instituições trouxe à tona, além de uma produção inédita, temas esquecidos e personagens obliterados pela historiografia, promovendo uma necessária revisão historiográfica. A troca entre os pesquisadores tem se dado em reuniões virtuais e em encontros presenciais agendados obrigatoriamente em locais alternados, inicialmente nas três sedes parceiras e com o passar do tempo em outras localidades desses três países na expectativa de ampliar os contatos - Bogotá (2009 e 2014), São Paulo (2011), Cidade do México (2013), Recife (2015), Oaxaca (2016) Bucaramanga (2018) e Curitiba(2020).

Não sendo possível a apresentação de todos os resultados, reunimos aqui alguns que ilustram a diversidade dos estudos realizados. A somatória das obras levantadas extrapola a centena, entre instituições culturais, escolas, habitações de interesse social, hospitais, equipamentos esportivos e praças, embora não cubra a realidade da arquitetura da Colômbia, do México e do Brasil deste século, permite-nos constatar algumas evidências e vislumbrar algumas questões. A pluralidade de soluções tem alimentado intensos debates na tentativa de criar uma classificação única para a análise de tão vasto conjunto, que permita agrupar os projetos segundo algumas similaridades para além de tipologia, geografia ou cronologia. As primeiras tentativas de estabelecer relações entre as obras expuseram a complexidade do próprio campo da arquitetura na contemporaneidade, em que cada obra tem uma contribuição específica à cultura arquitetônica que pode não se repetir em nenhuma outra, entretanto a excepcionalidade não lhe tira o mérito.

O esforço para a crítica dessa produção, a partir de categorias sugeridas pelas próprias obras analisadas ou pelos problemas enfrentados, serão tratados no primeiro trabalho: Arquitetura e cidade no processo criativo; o segundo analisa as interações entre a arquitetura e a memória traumática em museus latino-americanos; o terceiro apresenta um balanço dos compêndios latino-americanos de arquitetura produzidos na segunda metade do século passado; o quarto discute questões de crítica; o quinto traz a público a fecunda atuação no Brasil do engenheiro uruguaio Eladio Dieste e seus colaboradores, recuperando a apropriação de sua técnica entre os profissionais brasileiros, e o sexto discute os discursos que sustentam a emergência de arquiteturas do Paraguai, do Equador e da Colômbia baseadas nas experiências coletivas de criação e aprendizagem e na otimização dos recursos materiais.


Palavras-chave


Arquitetura; América Latina

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