Última alteração: 2022-06-17
Resumo
Em seu livro Outvertising – a publicidade fora do armário (2020), Leonardo Mozdzenski menciona como marco da Outvertising o anúncio impresso veiculado em 2015 pela joalheria norte-americana Tiffany & Co., retratando um casal homoafetivo em uma campanha de alianças de casamento. Essa foi a primeira vez na história da joalheria que um casal gay estampa uma campanha publicitária.
A outvertising - um jogo de palavras entre out – saída do armário - e advertising, que pode ser traduzido livremente como "publicidade fora do armário", consiste, segundo Mozdzenski, em “uma tendência contemporânea mais ampla que se baseia em uma proposta de protagonismo e empoderamento da comunidade LGBTI+, rompendo com as representações estereotipadas historicamente atreladas às dissidências sexogendéricas” (MOZDZENSKI, 2020, p. 25).
Partindo dessa definição, observamos que recentemente muitas marcas vêm se posicionando pelo reconhecimento e valorização da diversidade de sexualidades e gêneros. No contexto do Brasil, temos como exemplos as campanhas como a do Dia dos Namorados da marca de cosméticos O Boticário (2015), campanha do Dia das Mães da GOL Linhas Aérea (2015), do Dia do Beijo da marca de cremes dentais Close Up, intitulada “Close Up, liberte seu beijo” (2016) e, mais recentemente, em 2021, as campanhas “Como explicar?”, da Burger King e “I am What I am”, da marca de cervejas Amstel. Em comum, todas compartilham um discurso de valorização da diversidade, inserindo nas peças publicitárias pessoas LGBTI+ em situações afirmativas, de reconhecimento e celebração dos gêneros e sexualidades diversas.
Mas se por um lado essas campanhas promovem a visibilidade e representatividade das expressões sexogendéricas dissidentes, por outro elas também têm sofrido ataques homolesbobitransfóbicos, especialmente nas plataformas digitais de redes sociais. Por meio de discursos de ódio, grupos conservadores têm promovido boicotes a essas marcas, muitas vezes utilizando a violência nas redes sociais como forma de oposição. Isso foi o que aconteceu em relação à campanha da marca Burger King intitulada “Como explicar?", veiculada em 2021. Na principal peça publicitária, as crianças que protagonizaram a campanha compartilharam em um filme publicitário a sua perspectiva sobre a diversidade, explicando a partir das próprias vivências e referências, identidades de gênero diversas. Outro exemplo é a campanha do carro Polo, da Volkswagen Brasil, publicada no Instagram da VW Brasil em 2022, que apresenta em primeiro plano um casal gay com dois homens e o carro desfocado ao fundo, com a legenda: "Sabe o que evoluiu junto com você? O Polo".
Nossa proposta consiste em analisar essas campanhas a partir da metodologia de análise de representação, considerando as dimensões da poética (relacionadas aos discursos de exibição) e da política (relacionadas às relações de poder), nos termos de Stuart Hall (1997). O objetivo é problematizar o consumo de ativismo com foco na comunidade LGBTI+, discutindo a outvertising como uma forma das marcas se posicionarem em seus mercados de atuação, mas também de promoverem mudanças. No atual contexto complexo de emergência de polarizações, refletimos ainda sobre os motivos que as marcas levam em consideração para adotar a outvertising como uma estratégia publicitária.
A hipótese é que, no contexto de um consumo de ativismo, as empresas e organizações que levantam a bandeira da diversidade e inclusão conseguem uma maior diferenciação frente ao seu mercado de atuação. Dessa forma, o posicionamento em prol da diversidade é percebido pelo público como um valor da marca, ainda que esta sofra com os ataques de grupos conservadores.
O discurso de ódio contra a publicidade fora do armário emerge como reação compartilhada contra as peças publicitárias analisadas. Isso se organiza, em um primeiro aspecto, pelo reforço da perspectiva binária de gênero masculino/feminino presente em posicionamentos conservadores que repercutem nas redes sociais, em sentido análogo ao que Hall (1997) discute quando afirma que as minorias são geralmente descritas de forma binária e antitética - "bom/mal, civilizado/primitivo, feio/excessivamente atrativo…". Esse tipo de polarização, segundo Hall, demarca os aspectos ambivalentes da diferença historicamente construídos, organizando também hierarquias de poder a partir de quem controla a produção discursiva e seus significados simbólicos. No contexto das campanhas da Burger King e Volkswagen, isso pode ser observado pela forma como grupos conservadores atuam nas redes sociais reforçando as categorias binárias de gênero como únicas possíveis, em oposição ao conteúdo das narrativas de outvertising, que reconhecem a diversidade e pluralidade.
Palavras-chave: Outvertising; Diversidade, Inclusão, Gênero; Consumo de Ativismo.
Referências
BOTICÁRIO. Dia dos Namorados O Boticário. YouTube, 25 de mai. 2015. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=p4b8BMnolDI. Acesso em 22 mai. 2022
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