Última alteração: 2022-06-17
Resumo
O objetivo deste projeto é discutir as conexões que se estabelecem entre o cinema documental e o impeachment de Dilma Rousseff. Investigamos no corpus de análise, as estratégias narrativas utilizadas pelos filmes O Processo (Maria Augusta Ramos, 2018); Democracia em Vertigem (Petra Costa, 2019); Alvorada (Anna Muylaert e Lô Politi, 2020); Impeachment: do Apogeu à Queda (Brasil Paralelo, 2017); Impeachment, o Brasil nas Ruas (Beto Souza e Paulo Moura, 2017) e Não vai ter golpe! O Nascimento de um Brasil Livre (Alexandre Santos e Fred Rauh, 2019). Dividimos nosso estudo a partir de três eixos definidores: o primeiro é a linguagem e as teorias do cinema documentário, com suas vozes e diferentes maneiras de representar o real. O segundo se debruça sobre a construção da personagem de Dilma Rousseff em cada uma das narrativas. Já os conceitos fundantes da pesquisa nos levaram ao terceiro eixo, ou seja, as diferentes estratégias de convencimento discursivas utilizadas pelos filmes através de elementos como montagem, enquadramento, ângulo de filmagem, etc. A bibliografia fundamental deste trabalho se apoia nas seguintes obras dos teóricos franceses, Jacques Aumont e Michel Marie: A Estética do Filme e A Análise do filme. Ademais, nossa revisão bibliográfica se apropria das discussões de Bill Nichols em seu livro Introdução ao documentário, que traz um conjunto de questionamentos sobre o que é um filme documentário a partir de abordagens estéticas, epistemológicas e éticas. Espelho Partido, de Silvio Da-Rin, também nos auxilia na discussão deste gênero cinematográfico desde suas origens até às novas tendências e modelos de produção. Amplificando as contribuições de Da-Rin, Mas afinal...o que é mesmo documentário?, de Fernão Pessoa Ramos, propõe discutir questões como a diferença entre o documentário e a ficção, as transformações históricas dos modos de representação do documentário, e o mais importante, a reflexão de que o documentário “olha” os acontecimentos segundo sua própria narrativa, e que de forma alguma
representa objetivamente a “verdade” dos fatos. Ao mesmo tempo, Ver e Poder – A inocência perdida: cinema, televisão, ficção, documentário, de Jean-Louis Comolli, nos ajuda a aprofundar as discussões do cinema como arte política, em que se observam o lugar e a importância do espectador, os efeitos do espetáculo e a relação do gênero documental com os demais formatos audiovisuais da atualidade. Por último, Cineastas e imagens do povo, de Jean-Claude Bernardet, nos provoca a pensar o cinema brasileiro através de uma linha de investigação que problematiza a posição do sujeito que enuncia a representação. Quanto aos resultados parciais, esta pesquisa já evidenciou como os filmes O Processo e Impeachment, o Brasil nas Ruas se utilizam da técnica da entrevista e de outros elementos cinematográficos para construir sua visão política sobre o impeachment de Dilma Rousseff. Em O Processo, a diretora prefere não entrevistar diretamente as personagens, optando pelo modo de representação do cinema direto/modo observativo do documentário (NICHOLS, 2016). Embora não entreviste nenhuma das personagens filmadas, Ramos foca sua lente na movimentação das mesmas, assim como nas relações com o ambiente e os objetos à sua volta. Ao optar por este modo de registro da realidade filmada, a diretora de O Processo permite que o público alcance novas e diferentes camadas de interpretação das imagens, não abrindo mão, ao mesmo tempo, dos sons ambientes e das especificidades referentes à expressão das falas das personagens como lentidão ou aceleração, interrupção ou continuidade do fluxo de pensamento, entonação, espontaneidade, volume, dentre outras. Impeachment, o Brasil nas Ruas, por sua vez, faz uso das entrevistas como base de sua narrativa. Apesar de contar com a presença de alguns outros elementos pontuais como materiais audiovisuais de arquivo televisivo, fotografias, reportagens jornalísticas e interceptação telefônica de conversas entre Lula e Dilma, a estrutura do documentário tem como pilar principal de sustentação as entrevistas com representantes da direita brasileira, como o historiador Marco Antônio Vila e o ativista Fernando Holiday, do MBL. O documentário propõe uma abordagem professoral e objetiva dos fatos, não dando margem para outras interpretações sobre o impeachment de Rousseff. Deixando o bloco da esquerda sem qualquer tipo de representação, Impeachment, o Brasil nas Ruas, reafirma sua crença na legitimidade da condenação de Dilma através dos “depoimentos de alguns dos principais líderes e protagonistas deste bonito capítulo da história do Brasil”. (MOURA, 2016).[1]
[1] Ver em: https://www.vakinha.com.br/vaquinha/o-brasil-nas-ruas-pelo-impeachment-documentario