Portal de Conferências da UnB, VI Encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo

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“LÉXICO” DE ARQUITETURA E URBANISMO E MICROPOLÍTICA
Lutero Proscholdt de Almeida, Leonardo Izoton Braga, Clara Luiza Miranda, OSNILDO ADÃO WAN-DALL JUNIOR, Gabriel Teixeira Ramos, Samira de Sousa Proêza

Última alteração: 2020-08-19

Resumo


O objetivo desta sessão é apresentar a pesquisa “Léxico de arquitetura e urbanismo e micropolítica”, assim como divulgar sua a revista virtual, a revistalexico.org. Desta forma, para iniciar, compartilhamos da mesma angústia de Calvino:

Às vezes me parece que uma epidemia pestilenta atingiu a humanidade inteira em sua faculdade mais característica, ou seja, no uso da palavra, consistindo essa peste da língua numa perda de força cognoscitiva e de imediaticidade, como um automatismo que tendesse a nivelar a expressão em fórmulas mais genéricas, anônimas, abstratas, a diluir os significados, a embotar os pontos expressivos, a extinguir toda centelha que crepite no encontro das palavras com novas circunstâncias (CALVINO, 2009, s/p).

A pesquisa possui o objetivo de construir um platô coletivo com a contribuição de inúmeros parceiros. Em um momento de guerra conceitual, ao qual o estofo (stof en por Flusser) das palavras vem sendo preenchido e disputado em uma guerra híbrida; é preciso reconhecer que as palavras e os conceitos estão “perdendo” o sentido. Porém, tal premissa não pode ser tratada como distópica, mas como um início de um novo momento.

O intermezzo entre as palavras e as coisas é o local dessa guerra, que, em nosso propósito, é o local onde ela sempre deveria estar, pois não há e não deveria existir conceito consolidado e fechado sobre tudo. A palavra, ao longo da história, ganha peso com a sedimentação do seu uso; ela ganha um corpo que se engessa. Por exemplo: o que representa a palavra “comunismo” para nossa sociedade de predominância “neoliberal”? Mesmo relacionado aos fazeres comunitários tão presentes nos povos originários da América, Ásia e África é quase impossível relacionar a palavra comunismo com essas práticas, pois ela foi coercitivamente fabulada para um status “maligno e amaldiçoado”. A sacralização das palavras é o que não nos importa, mas, sim, a suspensão delas. A contínua investigação arqueológica dos conceitos.

Eu creio no poder das palavras, na força das palavras, creio que fazemos coisas com as palavras e também que as palavras fazem coisas conosco. As palavras determinam nossos pensamentos porque não pensamos com pensamentos, não pensamos de acordo com uma suposta genialidade ou inteligência, mas a partir de nossas palavras. Pensar é dar sentido ao que somos e ao que nos acontece (BONDÍA, 2001, p. 21).

O que podemos concluir é que o que vemos nas páginas de redes sociais é uma guerra informacional obscura. Um levante de fabulação de conceitos, em que muitas vezes não possui base nem comprometimento com as coisas. Por conta de uma herança “platônica” sempre esperamos muito das palavras, porém, é preciso enxergar filosoficamente e questionar as palavras, conceitos e verdades prontas. Sempre um simulacro dentro de um simulacro.

(...) a construção de conceitos não é apenas uma operação epistemológica, mas igualmente um projeto ontológico. Construir conceitos e o que eles chamam de "nomes comuns" é de fato uma atividade que combina inteligência e a ação da multidão, forçando-as a trabalhar juntas. Construir conceitos significa fazer existir, na realidade, um projeto que é uma comunidade (DELEUZE; GUATTARI, 2007, s/p).

Quando se conversa ou se discute sobre algo é comum que surjam confusões acerca de valores adotados e defendidos por cada indivíduo, pois cada indivíduo é constituído por um processo único, e ao confrontar com os outros, emergem-se discordâncias, concordâncias e mal-entendidos. Essa ambiguidade é intrínseca à comunicação, pois cada pessoa constrói o seu mundo, e este mundo é único no seu próprio contexto. Segundo Gilles Deleuze e Félix Guattari “o mínimo que se pode dizer sobre as discussões é que elas nunca falam da mesma coisa”. Em contrapartida às discussões, o que interessa é a criação, a criação de conceitos para um determinado problema.

As proposições urbanísticas e arquitetônicas estão vinculadas a esses conceitos, e eles foram sedimentando-se ao longo do tempo. Dos modelos do Movimento Moderno, que reverberaram no modernismo, ao modelo de Planejamento Estratégico de Borja, que suscitaram nas estratégias de formação das cidades globais. O percurso do conceituar ao fazer se atualiza de diversas formas e de diversas maneiras. Verifica-se então que o discurso pode gerar uma infinidade de repercussões, desdobramentos, e muitas vezes destoam das intenções iniciais do filósofo. Tais dissonâncias são inevitáveis, pois é impossível agir de forma que contemple todas as expectativas ou se iguale às mesmas situações de um conceito criado.

Por fim, a revista Léxico de arquitetura e urbanismo e micropolítica, possui o objetivo de construir um platô coletivo com a contribuição de inúmeros parceiros. Cada escritor irá tensionar/escrever sobre um conceito que ele trabalha, que lhe é íntimo. Com a inserção de vários trabalhos teceremos um plano coletivo, construindo uma espécie de glossário hipertextualizado.

REFERÊNCIAS

DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix.  O que é a filosofia? São Paulo, SP: Editora 34. 2007.

BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Conferência proferida no I Seminário Internacional de Educação de Campinas, traduzida e publicada, em julho de 2001.

CALVINO, Italo. Seis propostas para o próximo milênio. Tradução de Ivo Barroso. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2009.

Palavras-chave


Arquitetura e Urbanismo; Micropolítica; Léxico

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