Última alteração: 2020-08-18
Resumo
O campo de pesquisas históricas e da historiografia da arquitetura, da cidade e do urbanismo brasileiros do século XX já consolidaram as revistas especializadas como fonte documental de grande relevância. As revistas brasileiras e estrangeiras se configuram como suporte estratégico para fazer especulações, elaborar reflexões e problematizações acerca da produção de arquitetura, da consolidação do campo profissional e da relevância da arquitetura brasileira perante a opinião mundial. Acrópole, Módulo, Habitat, Domus, Architectural Review ou L´Architecture d´Aujourd´hui são periódicos que se configuram como meios fundamentais para a difusão de princípios e práticas, animando debates e influindo na atuação profissional.
Revistas podem ser exploradas por miríades de estratégias historiográficas. Destaca-se ainda que as revistas de arquitetura podem ser tomadas como conjuntos de documentos voltados para profissionais da área e profissionais de interesses conexos. Para explorar a reflexão sobre a cidade a relevância da arquitetura em uma revista de grande circulação, com grande tiragem e largo alcance público, mas que não tem um interesse profissional específico, esta Sessão Temática propõe tomar a Revista Manchete como objeto.
A Manchete foi fundada por Adolpho Bloch, que em parceria com seus irmãos, a partir de uma empresa gráfica de caráter familiar, consolidou um conglomerado de mídia que se expandiria, para muito além das publicações de livros, panfletos, material publicitário e histórias em quadrinhos, até incluir diversos títulos de revistas e a TV Manchete. A Manchete foi uma revista semanal, editada entre 1952 e 2000, com grande tiragem e ampla circulação, cujo alcance extrapola em muito um nicho profissional específico, com enorme penetração em diversos estratos sociais.
A Manchete se destacou perante os jornais e demais veículos de outros conglomerados de mídia, tendo como maior concorrente a revista O Cruzeiro. Em sua trajetória, diversas questões administrativas incidem para seu sucesso ou para seu traumático processo de falência. Para assegurar a sobrevivência da revista, especula-se muito sobre as aproximações dos irmãos Bloch com os vetores do poder, adaptando-se às circunstâncias políticas para assegurar o funcionamento da revista, por meio de um jogo social calculado, a fim de obter empréstimos, financiamentos, além de garantir os recursos da publicidade estatal. Tais articulações podem evidenciar aspectos do viés político da revista, que se manteve favorável ao desenvolvimentismo e à industrialização do país.
A revista possuía uma linha editorial com interesse amplo por temas diversificados, incluindo matérias de conteúdo estrangeiro, usando imagens das mais importantes agências internacionais, tal como a United Press International que juntamente com a Associated Press, a Reuters e a France-Presse, era considerada uma das mais importantes agências de notícias do mundo até a década de 1990. Para além da famosa edição de carnaval da revista, a Manchete consolidou uma linha editorial de interesse histórico, que pode ser aferida nos diversos números especiais, com edições sobre temas prementes ou personalidades, com destaque para os seguintes temas, por exemplo: a inauguração de Brasília, Amazônia, 4º. Centenário do Rio de Janeiro, a chegada do homem à lua, a Copa de 1970, a morte de JK ou a visita do Papa ao Brasil.
Além de matérias assinadas por jornalistas e por um extraordinário corpo editorial, a Manchete também apresentava uma força visual inconteste, destacando o fotojornalismo, seguindo os periódicos que lhe serviram de referência, como a Paris Mach ou a norte-americana Life. As fotografias eram parte fundamental da revista, ocupando em média 70% das edições. Para tanto, a Manchete tinha um Departamento fotográfico, formado por nomes como: Jean Manzon, Nicolau Drei, Orlando Machado, Antonio Rudge e Gervásio Baptista. Hoje, estima-se que o acervo de imagens da Bloch Editores é da ordem de 25 milhões de imagens, contendo uma variedade de temas sobre o Brasil e sobre o mundo. Trata-se de um valioso repertório imagético, com fotografias coloridas, cujo processo de difusão cotidiana se dá num contexto em que predominam o rádio e a televisão em preto-e-branco! Neste universo iconográfico, a arquitetura e as cidades brasileiras são apresentadas num processo de difusão, reiterando o valor da revista Manchete como documento para pesquisas.
Sendo uma revista de grande circulação, a Manchete interessa justamente por deter este potencial de difusão, afinal, por meio das reportagens, textos, material iconográfico, a revista divulgou arquiteturas, espaços, lugares e situações urbanas das cidades brasileiras, que servem de índices para novas reflexões acerca de nossos processos históricos. As matérias da Manchete apresentam a arquitetura e a cidade, selecionando fatos e interpretações ou ocultando outros tantos temas de seu público leitor.
Para esta Sessão Temática interessam explorar as indagações sobre os processos de escolha e valoração, especular sobre como a revista Manchete mostra, faz ver, faz pensar, revela, defende ou apresenta a arquitetura e os espaços de Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília. Que arquiteturas aparecem, ou não, na revista? Como são expostas e registradas? Que espaços, planos, projetos ou situações urbanas estão nas matérias? Quem escreve sobre arquiteturas e sobre as cidades? Quais são os temas de arquitetura e cidade que as edições da revista contêm? Para responder a estas e ouras tantas questões, esta Sessão Temática se estrutura a partir de quatro abordagens, a fim de explorar, justamente, as correlações entre assuntos cotidianos e temas específicos da arquitetura, da história da cidade e do urbanismo, que a revista Manchete publicou, afinal, “Aconteceu, virou Manchete”!
As 4 comunicações desta Sessão Temática são:
Salvador em manchete: entre a tradição e a modernização
Rio de Janeiro em Manchete: Os anos dourados e o fim de uma era
São Paulo em Manchete: a cidade “moderna” que mais cresce no mundo
Brasília em Manchete: projeto, cidade, mídia e nação