Última alteração: 2019-06-16
Resumo
É possível saber, a partir de diferentes períodos, se existe um elo entre: comunicação, governo e administração pública? Esta questão presume outras. De que modo ele poderá ter se formado e mesmo ser interpretado e (re)descrito com base na evidência histórica? A dúvida que motiva esta pesquisa, a princípio, deriva destas três questões apresentadas, acima de tudo, do ponto de partida que o originou: o ideal de comunicação (MATTELART, 1994; 1996; 1999; WOLTON, 2004; 2006; 2012), pelo qual os estados têm conduzido hoje a razão administrativa e a “comunicação” de governo. O ideal de comunicação é uma ideologia, instrumental, que decorre do desenvolvimento de fluxos e sistemas de comunicação, cuja base implica, sobretudo no século XIX, as “estradas de ferro, os correios, o telégrafo e a conservação das vidas públicas” (MATTELART, 1994, p. 53). Fundamentando essa concepção técnica de comunicação, o ideal irá abranger, anos mais tarde, a convergência entre computação e telecomunicações e a “atenção pública e os atores interessados em democracia e tecnologia quando, ainda nos anos 1970, nos Estados Unidos se começou a falar de teledemocracia e sua então estupefaciente capacidade de interatividade (GOMES, 2016, p. 45, grifo nosso). Neste sentido, partimos do objetivo geral de pensar, a partir de uma abordagem histórica, por que o ideal de comunicação do estado, para nós, pode ser ele mesmo o elo histórico entre: comunicação, governo e administração pública. Com base nesta afirmação, julgamos ser necessário estruturar nossa procura. Para tanto, devemos salientar que nós não pretendemos buscar a resposta para tais questões adentrando em tempos extremamente remotos, ainda que, em alguns momentos, seja conveniente adentrar em um passado mais antigo do que aquele que agora nós elegemos para o estudo. Assim, guiados pelo método da “fenomenologia da comunicação”, apresentada no quarto volume da revista Phänomenologische Forschungen (LIESEN, 2014, p.85), pensaremos o nosso objeto, o ideal.
A intenção do [volume] foi a de abrir um espaço para a crítica fenomenológica à visão instrumental dos conceitos de informação e comunicação. A proposta de uma “fenomenologia da comunicação” buscava denunciar a insuficiência das teorias informacionais e comunicacionais dominantes (principalmente oriundas da matemática e da cibernética), acusadas de reduzirem a comunicação à linguagem, ao signo e ao código, como uma forma pronta para a simbolização de qualquer conteúdo, e que não dariam conta da situação da chamada cultura comunicacional, tensionada de um lado pela perfeição técnica e pela massificação dos meios de comunicação e informação e [...] pela crescente desorientação e perda de sentido (LIESEM, 2014, p. 86).
De acordo com Maurício Liesen, “o objetivo de uma fenomenologia da comunicação” é “a análise e a representação das camadas e das instâncias mais fundamentais do fenômeno comunicativo” (LIESEM, 2014, p. 86). Para este autor, a “multiplicidade de etapas e superfícies é a própria condição de possibilidade da comunicação” (LIESEM, 2014, p. 86). Este método parece-nos adequado à medida que o ideal de comunicação, como nos referimos, se posiciona como uma ideologia que implica diferentes etapas do desenvolvimento da comunicação, enquanto técnica. E permeia a relação entre instâncias – o governo e a sociedade – que são bases para a comunicação pública. Em complemento ao método definido, utilizaremos a técnica de inteligibilidade redescritiva61 , proposta por Muniz Sodré (2014). Esta técnica é o instrumental que objetiva a (re)interpretação de períodos históricos a partir de uma plataforma interpretativa – elementos a serem analisados. Logo, a nossa pesquisa, a partir da plataforma comunicação, governo e administração, será um tipo de “redescrição” que permita a (re)interpretação da história daquele ideal instrumental. A princípio, nós apuramos que, sob os universalismos modernos, entre os quais o iluminismo e o liberalismo, o ideal de comunicação solidifica-se no século XX indicando um duvidoso objetivo de concretizar sob a marca no progresso, e sob a crença no futuro, o projeto democrático (MATTELART, 1999) e, por meio do qual, se estruturaria o eixo de um espaço mundial totalmente aberto. Logo, podemos afirmar que é a modernidade do século XX a era na qual se efetivou o elo que vincula os três elementos daquele conjunto? À primeira vista, sim. A modernidade é a responsável por efetivá-lo, mas não a origem. Os resultados parciais obtidos demonstram que o elo entre comunicação, governo e administração existe, factualmente, desde a era medieval. Este estudo se embasa em pesquisas bibliográficas efetuadas para a produção da pesquisa de mestrado – em curso – cuja ênfase é voltada para a verificação de transições do egoverno; este perpassa diferentes momentos da história do estado e das experiências que o guiaram às reformas administrativas contemporâneas a este início de século XXI.
Palavras-chave: História; Comunicação; Governo; Administração Pública; E-Governo.
Referências
GOMES, Wilson. Novos desafios para a ideia de transparência pública. Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho “Comunicação e Democracia” do VI Congresso da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (VI COMPOLÍTICA), na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), de 22 a 24 de abril de 2015.
LIESEN, Mauricio. Excommunicatio: Ensaio para uma teoria negativa da comunicação / São Paulo, 2014. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação – Escola de Comunicações e Artes / Universidade de São Paulo.
MATTELART, Armand. A invenção da comunicação. Lisboa: Instituto Piaget, 1994.
______. A Comunicação-mundo: história das ideias e das estratégias. Lisboa: Instituto Piaget, 1996.
______. A mundialização da comunicação. Lisboa: Instituto Piaget, 1999.
WOLTON, Dominique. Pensar a comunicação. Trad. de Zélia Leal Adghirni. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2004.
______ . É preciso salvar a comunicação. Trad. de Vanise Pereira Dresch. São Paulo: Paulus, 2006.
______. Internet, e depois? Uma teoria crítica das novas mídias. Trad. Isabel Crossetti. Porto Alegre: Sulina. 2012)
SODRÉ, Muniz. A ciência do comum: notas para o método comunicacional. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
____________. A ciência do comum: notas para o método comunicacional. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
____________. Antropológica do espelho: uma teoria da comunicação linear e em rede. 8. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.