Última alteração: 2019-06-13
Resumo
Mestranda em Comunicação pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Orientadora: Professora Doutora Suely Henrique de Aquino Gomes.
Resumo: Neste trabalho, utiliza-se a análise de discurso, com base no livro de Orlandi (2007), para investigar os ditos e os não ditos da mídia impressa na construção do sujeito com deficiência em função das mudanças ocorridas na legislação brasileira ao longo da história.
Palavras-chave: análise de discurso; mídia impressa; sujeito com deficiência; legislação brasileira.
Este trabalho tem por objetivo compreender a construção do sujeito com deficiência na mídia impressa em função das mudanças na legislação brasileira em diferentes momentos históricos. Para tanto, serão analisadas matérias veiculadas no jornal “O Estado de S. Paulo” em momentos que circundam a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, em 1988, a promulgação (pelo Decreto no 6.949) da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, em 2009, e a instituição da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência), em 2015. A opção pelo impresso deve-se à relevância que esses veículos mantêm na sociedade, como afirma Tuzzo (2016, p. 63) “a mídia impressa assume com frequência a função de suporte para orientar o uso das outras mídias”. A escolha do jornal “O Estado de S. Paulo” pautou-se em sua legitimidade. Fundado em 1875, conta com uma expressiva tiragem, os seus textos são reproduzidos em outros veículos de todo o país, coadunando com o que defende Tuzzo (2016) ao explanar sobre a importância da mídia impressa, somado ao fato de que o seu acervo se encontra digitalizado e, por tanto, mais acessível para a pesquisa proposta. Com este estudo, busca-se responder à questão-problema: como o sujeito com deficiência é construído na mídia impressa em razão das mudanças legislativas ocorridas, sobretudo, em momentos históricos? Para Gil (2002, p. 24), “pode-se dizer que um problema é de natureza científica quando envolve variáveis que podem ser tidas como testáveis”. Assim, a partir da definição do problema de pesquisa, estabeleceram-se três variáveis: a mídia impressa, a legislação e a noção de corpo, de deficiência. Os períodos escolhidos, como recorte temporal deste trabalho, representam conquistas legislativas para os sujeitos com deficiência, em graus progressivos. Destaca-se que esses sujeitos já foram tratados como “incapazes”, “aleijados”, “defeituosos” e, mais recentemente, como “pessoas deficientes”, “pessoas portadoras de deficiência”, como aparece no texto constitucional, e “pessoa com deficiência”. Essa última expressão pauta-se no modelo social, consagrado pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo e também utilizado como base do Estatuto da Pessoa com Deficiência. Longe de serem apenas denominações, por trás dessas nomenclaturas encontram-se conceitos. Bampi, Guilhem e Alves (2010) explanam acerca dos modelos médico e social de deficiência. O modelo social surgiu no Reino Unido, nos anos 60, em oposição ao modelo médico dominante. Enquanto o modelo médico atribui aos sujeitos a origem da desigualdade e busca tratamentos na área de saúde para combater a deficiência, o modelo social defende que a maior parte dos problemas enfrentados pelas pessoas com deficiência está na forma como a sociedade lida com o tema. Sob o aspecto teórico, busca-se em Foucault (2008) o conceito de dispositivo, que é a rede que se constitui entre elementos heterogêneos categorizados como ditos (discursos, leis, regulamentos e enunciados científicos) e não ditos (organizações arquitetônicas, instituições, proposições filosóficas, morais e filantrópicas). Deleuze (2017), ao analisar os estudos de Foucault sobre o dispositivo, afirma que o filósofo pensava em linhas em movimento, que ora se aproximam e ora se afastam umas das outras, podendo, em determinados momentos, sofrerem fissuras, fraturas, que conduzem a sociedade a novas subjetividades. Com isso, o que se almeja com este estudo é justamente buscar na mídia impressa os ditos e os não ditos, a partir das linhas que movem o dispositivo, tratado por Foucault (2008) e Deleuze (2017), em diferentes momentos históricos, recortados a partir de marcos na legislação brasileira, em relação aos sujeitos com deficiência, e em suas possíveis reverberações nos discursos midiáticos. Salienta-se que os discursos, as leis, entre outros elementos, compõem o dispositivo. Para se analisar o discurso da mídia em função das mudanças legislativas, optou-se pela metodologia de análise de discurso apresentada por Orlandi (2007). “A análise de discurso não estaciona na interpretação, trabalha seus limites, seus mecanismos, como parte dos processos de significação” (ORLANDI, 2007, p. 26). “[...] a análise de discurso visa à compreensão de como um objeto simbólico produz sentidos, como ele está investido de significância para e por sujeitos” (ORLANDI, 2007, p. 26). Para Orlandi (2007), a relação do sujeito com a linguagem nunca é inocente. Pelo contrário, falar é tomar partido, é identificar-se com, e essa relação extrapola a análise dos ditos, permeando também os não ditos, que devem ser trazidos para o âmbito da pesquisa se forem relevantes para os discursos analisados. A articulação do simbólico com o político, mais do que inevitável, está na base da constituição das subjetividades e da existência humana.
Referências
BAMPI, L.; GUILHEM, D.; ALVES, E. Modelo Social: uma nova abordagem para o tema deficiência. Revista Latino-americana de Enfermagem, São Paulo, jul./ago. 2010, p. 1-9.
DELEUZE, G. O que é um dispositivo. <http://www.uc.pt/iii/ceis20/conceitos_dispositivos/programa/deleuze_dispositivo>. Acesso em: 20 jul. 2017.
FOUCAULT, M. Microfísica do Poder. 25. ed. Trad.: Roberto Machado. Rio de Janeiro: Edições Graal, 2008.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
ORLANDI, E. P. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. 7. ed. Campinas, SP: Pontes, 2007.
PLANATO. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 jul. 2017.
PLANATO. Decreto no 6.949. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acesso em: 10 jul. 2017.
PLANATO. Lei no 13.146. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm>. Acesso em: 10 jul. 2017.
TUZZO, S. A. Os sentidos do impresso. Goiânia: Gráfica UFG, 2016.