Última alteração: 2019-06-08
Resumo
A autora é jornalista, graduada e mestra em Comunicação Social pela Universidade de Brasília.
Resumo: O trabalho a ser apresentado na Jornada Discente de Pesquisa em Comunicação se baseia em estudos desenvolvidos nos últimos anos pela autora da proposta, jornalista, graduada e mestra em Comunicação Social pela Universidade de Brasília. O objetivo é refletir sobre abordagens e metodologias para o estudo da prática comunicacional quilombola.
Palavras-chave: comunicação; mobilização; quilombolas; racismo; visibilidade.
A pesquisa sobre as práticas comunicacionais das minorias políticas é um desafio para os estudiosos da comunicação. Enfrentar esse desafio, no entanto, nos permite conhecer e entender a complexidade e a riqueza das experiências de comunidades negras como as quilombolas, que reivindicam direitos e buscam o fortalecimento mútuo. Com base em pesquisa de mestrado (NUNES, 2013) e em artigo publicado na revista Matrizes (NUNES; MOURA, 2016), pretendemos refletir como as mídias digitais podem ser consideradas um espaço de articulação destas comunidades no Brasil e um ambiente de diálogo com organizações negras, campesinas e profissionais do campo jornalístico.
Como procedimento metodológico, adotamos a revisão bibliográfica, o estudo exploratório, a pesquisa de campo e a análise de conteúdo. As ações desenvolvidas pelas comunidades quilombolas de Rio dos Macacos e seus parceiros foram o principal foco da pesquisa de campo. A partir da análise desta experiência, em especial, e de outras iniciativas identificamos novos processos comunicacionais em curso, com linguagens, plataformas e percursos diferenciados de articulação.
Importante ressaltar que a trajetória das comunidades descendentes de africanos no Brasil foi marcada pelo deslocamento forçado e pela luta contra a escravidão por quase quatro séculos. A historiografia não consegue precisar, mas estima-se em quatro milhões o número de africanos traficados para o Brasil entre 1520 e 1850. Alguns estudos chegam a mencionar 15 milhões de africanos escravizados no país, uma vez que muitos deles eram contrabandeados até mesmo depois da abolição, em 1888 (MOURA, 1987).
Mesmo separados de suas famílias e grupos étnicos, africanas, africanos e seus descendentes criaram na diáspora negra novos laços e recorreram a diversas formas de resistência, como guerrilhas, insurreições urbanas e quilombos – esta última possuindo referência em uma expressão africana (“banto”) que remete à habitação. Na região central da Bacia do Congo, “quilombo” também significa “lugar para estar com Deus”.
Esses territórios reuniram milhares de africanos e descendentes, permanecendo habitados após a abolição da escravatura. Na atualidade, os quilombolas – aqueles que habitam territórios remanescentes de quilombo – seguem em luta pela titulação de suas terras, contra o racismo, pela autoafirmação cultural e pelo acesso a políticas públicas de saúde, educação, cultura e desenvolvimento agrário.
Como as comunidades quilombolas e rede de parceiros utilizam processos comunicacionais articulados com atividades de mobilização, visibilidade e empoderamento? Os resultados desta investigação contínua mostram que as comunidades quilombolas e seus parceiros constituíram redes (SCHERER-WARREN, 2006) para a mobilização e sensibilização da sociedade, desenvolvendo ações e processos comunicacionais inovadores no “bios midiático” (CABRAL, 2010), que ao mesmo tempo remetem a uma trajetória diaspórica de luta e resistência (MOURA, C., 1987; HALL, 2003; PINTO, 2010; ANJOS, 2011).
Essas ações e processos têm se revertido em visibilidade e empoderamento das comunidades, mas ainda demandam novas pesquisas, metodologias e políticas públicas para que as experiências de comunicação afrocentradas sejam compreendidas e replicadas, contribuindo para o efetivo reconhecimento dos direitos quilombolas e para o enfrentamento do racismo até mesmo no âmbito dos meios de comunicação hegemônicos.
Referências
ANJOS, R. S. A. dos. Territorialidade quilombola: fotos & mapas. Brasília, DF: Mapas Editora & Consultoria, 2011.
CABRAL, Muniz. Claros e escuros: identidade, povo e mídia no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1999.
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HALL, S. Identidade cultural e diáspora. Revista do IPHAN, Brasília, DF, n. 24, p. 68-75, 1996.
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MOURA, C. Quilombos: resistência ao escravismo. 3. ed. São Paulo: Ática, 1987.
NUNES, Juliana Cézar; MOURA, Dione Oliveira. Vivências diaspóricas em comunidades quilombolas: empoderamento, autorreflexão e novas sociabilidades na comunidade Rio dos Macacos. Matrizes (Online), v. 10, p. 203, 2016.
NUNES, J. C. Comunicação quilombola: cenários de mobilização, visibilidade e empoderamento. 2013. 136 f., il. Dissertação (Mestrado em Comunicação) – Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2013. PINTO, Ana Flávia Magalhães. Imprensa negra no Brasil do século XIX. São Paulo: Selo Negro, 2010.
SCHERER-WARREN, I. Redes de movimentos sociais na América Latina: caminhos para uma política emancipatória? Cadernos do CRH, Salvador, v. 21, n. 54, p. 505-517, 2008.