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A VALORIZAÇÃO DO GRAFITE COMO DOCUMENTO DE ARQUIVO: UMA ABORDAGEM INTERDISCIPLINAR ENTRE A COMPETÊNCIA EM INFORMAÇÃO E A TEORIA DA COMPLEXIDADE
Última alteração: 2017-10-05
Resumo
RESUMO
Objetivou-se analisar se a competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para a valorização e institucionalização do grafite como documento passível de tratamento em arquivos públicos. Realizou-se uma pesquisa bibliográfica, de natureza qualitativa. Os resultados demonstraram que o padrão de competência em informação que corresponde à necessidade de fontes confiáveis para acesso efetivo da informação, justifica e auxilia a ideia de institucionalização do grafite como documento de arquivo, visto que fornecerá um acesso padrão, libertador e duradouro à sociedade que decidir utilizar e acessar o grafite documentado em arquivos públicos. Ademais, um dos princípios do pensamento complexo refletiu para o fato de que não há como escapar desse processo de institucionalização do grafite, porque esse é um desenho da sociedade, é efeito de alguma causa e configura momentos da história do país e do povo. Se a história não pode ser apagada, tampouco o grafite como elemento dessa história deve ser. Verificou-se que aspectos da competência em informação e da teoria da complexidade podem auxiliar no processo de institucionalização do grafite como documento de arquivo e que esses aspectos possuem potencial futuro para contribuir para a quebra de um paradigma cartesiano que envolve esse assunto.
PALAVRAS-CHAVE: Competência em informação; teoria da complexidade; institucionalização do grafite; arquivos públicos.
ABSTRACT
The objective was to analyze whether information literacy and complexity theory can contribute to the valorization and institutionalization of graphite as a document that can be processed in public archives. A qualitative bibliographical research was carried out. The results demonstrated that the standard of information literacy that corresponds to the need for reliable sources for effective access to information justifies and supports the idea of graphitization as an archival document, since it will provide a standard, liberating and lasting access to the society that Decide to use and access graphite documented in public archives. In addition, one of the principles of complex thinking reflected the fact that there is no escape from this process of institutionalization of graphite, because it is a design of society, is an effect of some cause and configures moments of the history of the country and the people. If the story can not be erased, neither should graphite as element of this story be. In this way, it was verified that aspects of information literacy and complexity theory can help in the process of institutionalization of graphite as an archival document and that these aspects have future potential to contribute to the breaking of a Cartesian paradigm that involves this subject.
KEYWORDS: Information literacy; complexity theory; institutionalization of graphite; public archives.
1 Introdução
A sociedade atual segue pautada e imersa em ambientes que produzem informação, conhecimento, sentimentos e expressão em grande quantidade. Isso porque transformações ocorrem diariamente, como, por exemplo, o advento prático e generalizado das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) e o aumento do número de interações entre pessoas e organizações.
Entretanto, mesmo com o aumento das interações, estimuladas pelo uso das TICs, a sociedade ainda possui como personalidade e característica comportamentos cartesianos e positivistas, que separam áreas do conhecimento, que acreditam na lógica absoluta, na separabilidade e na prática superespecializada das pessoas que se inserem em ambientes organizacionais.
As instituições de ensino e educação, que possuem como objetivo formar cidadãos e profissionais, necessitam, nesse contexto, se tornar conscientes acerca da relevância de trabalhar com os alunos, justamente, a quebra desse paradigma cartesiano, e com isso , acreditar e utilizar abordagens e processos que possam contribuir para a construção e o desenvolvimento de uma nova sociedade integrativa, interdisciplinar, competente em informação e humana.
Neste trabalho, a valorização do grafite como documento de arquivo , será pauta e ideia prática no desenvolvimento da quebra de paradigma descrita anteriormente.
O grafite como prática da arte urbana costuma despertar um turbilhão de emoções, experiências e desejos no agente praticante, como também desperta esses sentimentos no agente contemplador. (GRUNOW, 2013)
Assim, dentro da importância dessa expressão cultural e informacional, tem-se a “[...] consciência de que é preciso conservar tais registros, tendo em vista uma futura utilização”. (SILVA, 1999, p.46)
Como foco da pesquisa , desfruta-se da reflexão de como a competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para a relevância da institucionalização do grafite como documento passível de tratamento em arquivos públicos.
A competência em informação é considerada um processo contínuo de competências e habilidades voltadas à compreensão e interação efetivas com o universo informacional. (DUDZIAK, 2003)
A teoria da complexidade possui inúmeros tratamentos, e um contexto amplo para ser entendido, no entanto, pode ser brevemente aqui discorrida por meio do conceito do pensamento complexo, descrito por Morin (2007) como a compreensão da contradição e do imprevisível, da pluralidade e da unidade, da ordem e da desordem, a partir da convivência com eles, pois esse é o fundamento do pensamento complexo, distinguir, mas não separar.
Com base nestas contextualizações e reflexões, a presente pesquisa possui como problemas: a institucionalização do grafite pode ser considerado uma prática para quebra do paradigma cartesiano? A competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para essa prática?
O objetivo é analisar se a competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para a valorização do grafite como documento de arquivo .
Justifica-se por ser um trabalho de cunho interdisciplinar, que relaciona temas do campo da Ciência da Informação, da Arquivologia e da Educação, e que pretende por meio deste estudo enriquecer o arcabouço teórico de tais campos do conhecimento.
Para tanto, será realizada uma pesquisa bibliográfica, de natureza qualitativa.
2 Teoria da Complexidade: propulsora de mudanças
A teoria da complexidade parte primeiramente de uma tomada de consciência necessária para o seu entendimento, e principalmente para sua existência na prática.
Essa tomada de consciência acontece pelo princípio do saber de que a sociedade está adepta a adquirir novos conhecimentos, a todo tempo, sobre o mundo físico, biológico, psicológico, sociológico, entre outros (MORIN, 2007).
Entende-se complexidade como um “[...] tecido de acontecimentos, ações, interações, retroações, determinações, acasos, que constituem nosso mundo fenomênico” (MORIN, 2007 p.13). Ou seja, a complexidade está diretamente voltada à interação, novas descobertas do saber e do fazer ciência, novas formas de agir, de adquirir conhecimento, de olhar a informação, novas formas de encarar a sociedade e seus fenômenos e por fim, um novo modo de olhar o mundo e de vivê-lo.
Assim, entende-se que o pensamento complexo é um pensamento que lida com a incerteza, porém encontra-se preparado para reunir, contextualizar, globalizar e integralizar, bem como, concomitantemente apto em reconhecer o singular, o individual e o concreto (MORIN, 2000).
Neste trabalho, a intenção é seguir a teoria da complexidade e a competência em informação como processos que podem auxiliar a expressão informacional da arte do grafite ser captada em um documento passível de tratamento.
3 Competência em Informação
Muitas dúvidas passam a surgir, como por exemplo, como produzir, organizar, compartilhar, acessar e utilizar a informação de maneira correta. Usualmente , nestes contextos a informação e o conhecimento são requeridos para tomada de decisão, seja em âmbito profissional ou pessoal. Nesse meio , surge então a competência em informação, como processo e filosofia da informação e do conhecimento, que abarca e busca solucionar todas essas dúvidas.
De acordo com Belluzzo, Kobayashi e Feres (2004), a competência em informação pode ser considerada um conjunto de comportamentos, competências, habilidades e ações que promovem o acesso e o uso da informação de maneira eficiente e eficaz, visando a construção do conhecimento e a intervenção na realidade social.
Na esfera social, Doyle (1994) afirma que pessoas competentes em informação se tornam capazes de reconhecer que a informação precisa e detalhada é crucial para tomada de decisões inteligentes. Também desenvolvem aptidões relativas ao reconhecimento das suas necessidades informacionais, identificação de fontes efetivas de informação, criação de estratégias de busca da informação e integração da informação coletada à prática e ao processo de construção do conhecimento.
Rader (1995) visualiza que as pessoas competentes em informação se tornam potenciais em levar uma vida produtiva e saudável, tendo como característica a aceitação das mudanças e transformações sociais e a consciência de que a informação apropriada e internalizada auxilia na resolução dos problemas, tanto pessoais como profissionais.
A competência em informação é desse modo uma prática de libertação, de leitura de sentimentos, e de expressão, que ao mesmo tempo se traduz em informação e conhecimento.
4 O grafite como documento
Silva-e-Silva (2011, p. 22) caracteriza como o estopim do grafite o evento ocorrido na França em 1968. Nesse período o país vivenciava o chamado “Movimento de maio de 68”, uma grande onda de protestos que teve início com manifestações estudantis para reivindicar reformas educacionais.
Os graffitis serviam para registrar na cidade descontentamentos e protestos, foi uma possibilidade que as pessoas encontraram para demarcar, extravasar e difundir as recusas e expectativas transcendentes naquele momento. (SILVA-E-SILVA, 2011, p.22).
Posteriormente paredes e vagões de trens dos metrôs da cidade de Nova Iorque passaram a suscitar o interesse dos escritores urbanos, que começam a utilizar esse espaço como suporte do grafite.
Silva-e-Silva (2011, p.47) explica que “existem muitas opiniões distintas, e nenhum consenso sobre o que é grafite. Existem alguns poucos conceitos que tentam, isoladamente, especificar o campo.”
O grafite segundo o autor é independente de ação e sujeito, e cada um é determinado significativamente em si próprio sem que para isso exista uma definição padrão para o mesmo, além, exclusivamente da sua caracterização como expressão imagética.
Albuquerque (2004, p.10) diz que “a gama de informações visuais que são passadas a todo momento é imensa, e o grafite é uma produção visual que comunica, informa, diverte e que tem a cidade como seu suporte.”
Autores que trabalham com a arte do grafite tais como Nicholas Ganz, Silva-e-Silva, Elisabeth Seraphim e Frederico Morais apontam que a arte não nasce do nada, existe um valor motivacional para a elaboração do grafite. Não se trata de um mero ato de vandalismo, o grafiteiro manifesta na obra uma necessidade de expor algo.
Arte e democracia são palavras irmãs. Ambas filhas da liberdade – da liberdade de expressão. A democracia se conquista na rua, na praça, onde quer que alguém possa colocar um tamborete, erguer a voz e o braço e clamar por seus direitos. Só depois de exigida na rua, ela vai ser ouvida nos auditórios, nas assembleias, nos tribunais. (MORAIS, 1992, p.48)
Assume-se então que o grafite traduz uma necessidade de expressão da sociedade, de mostrar satisfação ou insatisfação com relação ao que ele vivencia, de deixar claro que existem necessidades coletivas que precisam ser supridas e ganharem voz na rua.
Pode-se dizer que o grafite é informação e conhecimento tácito externalizado, que ganha voz nas ruas, e que possui essas como suporte, entretanto essa informação e esse conhecimento são efêmeros, uma arte dinâmica que muda ou desaparece em um período temporal que pode ser curto ou longo, não há como determinar quando alguém vai modificá-lo, apagá-lo, ou até mesmo quando acontecimentos naturais (ex. sol e chuva) vão cooperar para que ele desapareça.
Justifica-se portanto a conversão do suporte original do grafite para documento fotográfico, por se tratar de um representação que conta uma história social, e por possuir característica dinâmica que pode se perder.
5 Considerações Finais
Buscou-se analisar se a competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para a valorização do grafite como documento de arquivo e responder as seguintes problemáticas: a institucionalização do grafite pode ser considerado uma prática para quebra do paradigma cartesiano? A competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para essa prática?
Por meio das discussões, pôde-se notar que a competência em informação, que estabelece que o sujeito deve identificar sua necessidade informacional, contribui para os grafiteiros conseguirem resgatar grafites já produzidos para servir de inspiração e construção de novos conhecimentos. O acesso efetivo e inteligente das fontes de informação propicia aos grafiteiros melhor preparo para elaboração da sua expressão informacional. Além disso, essa expressão quando institucionalizada, servirá de base para acessos externos de estudiosos e sociedade no geral.
O padrão que corresponde à necessidade de fontes confiáveis para acesso efetivo da informação, justifica e auxilia a ideia de institucionalização do grafite como documento de arquivo, visto que fornecerá um acesso padrão, libertador e duradouro à sociedade que decidir utilizar e acessar o grafite documentado em arquivos públicos.
A competência em informação assegura que uma pessoa competente em informação deve utilizar a informação e tomar decisões tanto individualmente como em grupo, pois isso gera fenômenos do compartilhamento e socialização da informação, que resultará em conhecimento. Esse fator pode apoiar no processo de institucionalização do grafite, visto que, a união de vários a favor desse acontecimento poderá transformar essa ideia em prática. Ademais, o grafite representa grupos de pessoas, e sua produção se dá por um ser cognoscente, carregado de interferências e induções de outras pessoas. Logo, a força desses processos está na união.
Quanto à análise da teoria da complexidade, notou-se que o princípio sistêmico e o princípio hologramático concordam que existem complexidades no processo do grafite, porque ao mesmo tempo que a importância dessa arte está no todo que ela representa para cada um, suas fragmentações relacionadas ao momento em que foram desenvolvidas também são pontos importantes de serem elencados. Logo, têm-se a consciência que o todo não exclui as partes, e nem as partes devem excluir o todo.
O terceiro princípio, indiretamente, reflete para o fato de que não há como escapar desse processo de institucionalização do grafite, justamente porque esse é um desenho da sociedade, é efeito de alguma causa e configura e denomina momentos da história de um país e de um povo. Se a história não pode ser apagada, tampouco o grafite como elemento dessa história deve ser.
Por hora, o grafite também se define como um processo de autonomia e superação do ser humano e concomitantemente é resistência contra a falta da liberdade de expressão, e isso é expresso no princípio de auto-eco-organização de Morin (2000). Logo, a institucionalização do grafite necessita ganhar força por uma luta que está começando.
Dessa maneira, verificou-se que aspectos da competência em informação e da teoria da complexidade podem auxiliar no processo de institucionalização do grafite como documento de arquivo e que esses aspectos possuem potencial futuro para contribuir para a quebra de um paradigma cartesiano que envolve esse assunto. Essa abordagem torna-se necessária para o fortalecimento da integração das partes que constituem o mundo. Tudo está interconectado e o papel do pesquisador torna-se incentivar essas inter-relações.
Por fim, como apoio ao desenvolvimento de pesquisas futuras, indica-se a realização de uma pesquisa de campo que envolve os temas inter-relacionados neste artigo, e que busque ouvir a população que recebe esses grafites, os produtores (grafiteiros) e os arquivos públicos.
Referências
ALBUQUERQUE, A. C. de. O grafite como canal alternativo de informações: caminhos para uma discussão interdisciplinar em ciência da informação. Revista de iniciação científica da FFC, v.4 n.3, 2004. Disponível em: Acesso em: 13 jun de 2017.
BELLUZZO, R.C.B.; KOBAYASHI, M.C.M.; FERES, G.G. Information literacy: um indicador de competência para a formação de professores na sociedade do conhecimento. ETD – Educação Temática Digital. 2004, v.6, n.1, p.81-99. Disponível em: . Acesso em 10 mai. 2017.
DOYLE, Christina. Information literacy in an information on society: a concept for the information age. Syracuse: Eric, 1994.
DUDZIAK, E.A. Information literacy: princípios, filosofia e prática. Ciência da Informação, Brasília, v.32, n.1, p.23-35, jan./abr. 2003. Disponível em:. Acesso em 01 jul. 2017.
GRUNOW, R. A.S. O fenômeno arte sobre o fenômeno humano: grafite e valor mutante da estética. Revista de Letras, Artes e Comunicação. Blumenau, v.7, n.3, p.299-244, set./dez. 2014. Disponível em: < http://proxy.furb.br/ojs/index.php/linguagens/article/view/3834>. Acesso em 02 jun. 2017.
MORAIS, Frederico. Anos 80: a pintura resiste. BR 80 – Cenário social da década. In: BR 80 Pintura Brasil década de 80. São Paulo: Itaú Cultural, 1992.
MORIN, Edgar. Ciência e consciência da complexidade. In: MORIN, Edgar; LE MOIGNE, Jean-Louis (Org.). A inteligência da complexidade. São Paulo: Peirópolis, 2000. 265p.
______. Introdução ao pensamento complexo. Tradução de Eliane Lisboa. Porto Alegre: Sulina, 3º Edição, 2007. 120p.
RADER, H.B. Bibliographic Instruction or Information Literacy – 1990. College and Research Libraries News, v.51, n.1, p.18-20, 1991.
SILVA-E-SILVA, William da. Graffitis em múltiplas facetas: definições e leituras iconográficas. São Paulo: Annablume, 2011, 130p.
SILVA, A.M. Arquivística: teoria e prática de uma ciência da informação. Porto: Afrontamento, 1999, 254p.
Objetivou-se analisar se a competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para a valorização e institucionalização do grafite como documento passível de tratamento em arquivos públicos. Realizou-se uma pesquisa bibliográfica, de natureza qualitativa. Os resultados demonstraram que o padrão de competência em informação que corresponde à necessidade de fontes confiáveis para acesso efetivo da informação, justifica e auxilia a ideia de institucionalização do grafite como documento de arquivo, visto que fornecerá um acesso padrão, libertador e duradouro à sociedade que decidir utilizar e acessar o grafite documentado em arquivos públicos. Ademais, um dos princípios do pensamento complexo refletiu para o fato de que não há como escapar desse processo de institucionalização do grafite, porque esse é um desenho da sociedade, é efeito de alguma causa e configura momentos da história do país e do povo. Se a história não pode ser apagada, tampouco o grafite como elemento dessa história deve ser. Verificou-se que aspectos da competência em informação e da teoria da complexidade podem auxiliar no processo de institucionalização do grafite como documento de arquivo e que esses aspectos possuem potencial futuro para contribuir para a quebra de um paradigma cartesiano que envolve esse assunto.
PALAVRAS-CHAVE: Competência em informação; teoria da complexidade; institucionalização do grafite; arquivos públicos.
ABSTRACT
The objective was to analyze whether information literacy and complexity theory can contribute to the valorization and institutionalization of graphite as a document that can be processed in public archives. A qualitative bibliographical research was carried out. The results demonstrated that the standard of information literacy that corresponds to the need for reliable sources for effective access to information justifies and supports the idea of graphitization as an archival document, since it will provide a standard, liberating and lasting access to the society that Decide to use and access graphite documented in public archives. In addition, one of the principles of complex thinking reflected the fact that there is no escape from this process of institutionalization of graphite, because it is a design of society, is an effect of some cause and configures moments of the history of the country and the people. If the story can not be erased, neither should graphite as element of this story be. In this way, it was verified that aspects of information literacy and complexity theory can help in the process of institutionalization of graphite as an archival document and that these aspects have future potential to contribute to the breaking of a Cartesian paradigm that involves this subject.
KEYWORDS: Information literacy; complexity theory; institutionalization of graphite; public archives.
1 Introdução
A sociedade atual segue pautada e imersa em ambientes que produzem informação, conhecimento, sentimentos e expressão em grande quantidade. Isso porque transformações ocorrem diariamente, como, por exemplo, o advento prático e generalizado das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) e o aumento do número de interações entre pessoas e organizações.
Entretanto, mesmo com o aumento das interações, estimuladas pelo uso das TICs, a sociedade ainda possui como personalidade e característica comportamentos cartesianos e positivistas, que separam áreas do conhecimento, que acreditam na lógica absoluta, na separabilidade e na prática superespecializada das pessoas que se inserem em ambientes organizacionais.
As instituições de ensino e educação, que possuem como objetivo formar cidadãos e profissionais, necessitam, nesse contexto, se tornar conscientes acerca da relevância de trabalhar com os alunos, justamente, a quebra desse paradigma cartesiano, e com isso , acreditar e utilizar abordagens e processos que possam contribuir para a construção e o desenvolvimento de uma nova sociedade integrativa, interdisciplinar, competente em informação e humana.
Neste trabalho, a valorização do grafite como documento de arquivo , será pauta e ideia prática no desenvolvimento da quebra de paradigma descrita anteriormente.
O grafite como prática da arte urbana costuma despertar um turbilhão de emoções, experiências e desejos no agente praticante, como também desperta esses sentimentos no agente contemplador. (GRUNOW, 2013)
Assim, dentro da importância dessa expressão cultural e informacional, tem-se a “[...] consciência de que é preciso conservar tais registros, tendo em vista uma futura utilização”. (SILVA, 1999, p.46)
Como foco da pesquisa , desfruta-se da reflexão de como a competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para a relevância da institucionalização do grafite como documento passível de tratamento em arquivos públicos.
A competência em informação é considerada um processo contínuo de competências e habilidades voltadas à compreensão e interação efetivas com o universo informacional. (DUDZIAK, 2003)
A teoria da complexidade possui inúmeros tratamentos, e um contexto amplo para ser entendido, no entanto, pode ser brevemente aqui discorrida por meio do conceito do pensamento complexo, descrito por Morin (2007) como a compreensão da contradição e do imprevisível, da pluralidade e da unidade, da ordem e da desordem, a partir da convivência com eles, pois esse é o fundamento do pensamento complexo, distinguir, mas não separar.
Com base nestas contextualizações e reflexões, a presente pesquisa possui como problemas: a institucionalização do grafite pode ser considerado uma prática para quebra do paradigma cartesiano? A competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para essa prática?
O objetivo é analisar se a competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para a valorização do grafite como documento de arquivo .
Justifica-se por ser um trabalho de cunho interdisciplinar, que relaciona temas do campo da Ciência da Informação, da Arquivologia e da Educação, e que pretende por meio deste estudo enriquecer o arcabouço teórico de tais campos do conhecimento.
Para tanto, será realizada uma pesquisa bibliográfica, de natureza qualitativa.
2 Teoria da Complexidade: propulsora de mudanças
A teoria da complexidade parte primeiramente de uma tomada de consciência necessária para o seu entendimento, e principalmente para sua existência na prática.
Essa tomada de consciência acontece pelo princípio do saber de que a sociedade está adepta a adquirir novos conhecimentos, a todo tempo, sobre o mundo físico, biológico, psicológico, sociológico, entre outros (MORIN, 2007).
Entende-se complexidade como um “[...] tecido de acontecimentos, ações, interações, retroações, determinações, acasos, que constituem nosso mundo fenomênico” (MORIN, 2007 p.13). Ou seja, a complexidade está diretamente voltada à interação, novas descobertas do saber e do fazer ciência, novas formas de agir, de adquirir conhecimento, de olhar a informação, novas formas de encarar a sociedade e seus fenômenos e por fim, um novo modo de olhar o mundo e de vivê-lo.
Assim, entende-se que o pensamento complexo é um pensamento que lida com a incerteza, porém encontra-se preparado para reunir, contextualizar, globalizar e integralizar, bem como, concomitantemente apto em reconhecer o singular, o individual e o concreto (MORIN, 2000).
Neste trabalho, a intenção é seguir a teoria da complexidade e a competência em informação como processos que podem auxiliar a expressão informacional da arte do grafite ser captada em um documento passível de tratamento.
3 Competência em Informação
Muitas dúvidas passam a surgir, como por exemplo, como produzir, organizar, compartilhar, acessar e utilizar a informação de maneira correta. Usualmente , nestes contextos a informação e o conhecimento são requeridos para tomada de decisão, seja em âmbito profissional ou pessoal. Nesse meio , surge então a competência em informação, como processo e filosofia da informação e do conhecimento, que abarca e busca solucionar todas essas dúvidas.
De acordo com Belluzzo, Kobayashi e Feres (2004), a competência em informação pode ser considerada um conjunto de comportamentos, competências, habilidades e ações que promovem o acesso e o uso da informação de maneira eficiente e eficaz, visando a construção do conhecimento e a intervenção na realidade social.
Na esfera social, Doyle (1994) afirma que pessoas competentes em informação se tornam capazes de reconhecer que a informação precisa e detalhada é crucial para tomada de decisões inteligentes. Também desenvolvem aptidões relativas ao reconhecimento das suas necessidades informacionais, identificação de fontes efetivas de informação, criação de estratégias de busca da informação e integração da informação coletada à prática e ao processo de construção do conhecimento.
Rader (1995) visualiza que as pessoas competentes em informação se tornam potenciais em levar uma vida produtiva e saudável, tendo como característica a aceitação das mudanças e transformações sociais e a consciência de que a informação apropriada e internalizada auxilia na resolução dos problemas, tanto pessoais como profissionais.
A competência em informação é desse modo uma prática de libertação, de leitura de sentimentos, e de expressão, que ao mesmo tempo se traduz em informação e conhecimento.
4 O grafite como documento
Silva-e-Silva (2011, p. 22) caracteriza como o estopim do grafite o evento ocorrido na França em 1968. Nesse período o país vivenciava o chamado “Movimento de maio de 68”, uma grande onda de protestos que teve início com manifestações estudantis para reivindicar reformas educacionais.
Os graffitis serviam para registrar na cidade descontentamentos e protestos, foi uma possibilidade que as pessoas encontraram para demarcar, extravasar e difundir as recusas e expectativas transcendentes naquele momento. (SILVA-E-SILVA, 2011, p.22).
Posteriormente paredes e vagões de trens dos metrôs da cidade de Nova Iorque passaram a suscitar o interesse dos escritores urbanos, que começam a utilizar esse espaço como suporte do grafite.
Silva-e-Silva (2011, p.47) explica que “existem muitas opiniões distintas, e nenhum consenso sobre o que é grafite. Existem alguns poucos conceitos que tentam, isoladamente, especificar o campo.”
O grafite segundo o autor é independente de ação e sujeito, e cada um é determinado significativamente em si próprio sem que para isso exista uma definição padrão para o mesmo, além, exclusivamente da sua caracterização como expressão imagética.
Albuquerque (2004, p.10) diz que “a gama de informações visuais que são passadas a todo momento é imensa, e o grafite é uma produção visual que comunica, informa, diverte e que tem a cidade como seu suporte.”
Autores que trabalham com a arte do grafite tais como Nicholas Ganz, Silva-e-Silva, Elisabeth Seraphim e Frederico Morais apontam que a arte não nasce do nada, existe um valor motivacional para a elaboração do grafite. Não se trata de um mero ato de vandalismo, o grafiteiro manifesta na obra uma necessidade de expor algo.
Arte e democracia são palavras irmãs. Ambas filhas da liberdade – da liberdade de expressão. A democracia se conquista na rua, na praça, onde quer que alguém possa colocar um tamborete, erguer a voz e o braço e clamar por seus direitos. Só depois de exigida na rua, ela vai ser ouvida nos auditórios, nas assembleias, nos tribunais. (MORAIS, 1992, p.48)
Assume-se então que o grafite traduz uma necessidade de expressão da sociedade, de mostrar satisfação ou insatisfação com relação ao que ele vivencia, de deixar claro que existem necessidades coletivas que precisam ser supridas e ganharem voz na rua.
Pode-se dizer que o grafite é informação e conhecimento tácito externalizado, que ganha voz nas ruas, e que possui essas como suporte, entretanto essa informação e esse conhecimento são efêmeros, uma arte dinâmica que muda ou desaparece em um período temporal que pode ser curto ou longo, não há como determinar quando alguém vai modificá-lo, apagá-lo, ou até mesmo quando acontecimentos naturais (ex. sol e chuva) vão cooperar para que ele desapareça.
Justifica-se portanto a conversão do suporte original do grafite para documento fotográfico, por se tratar de um representação que conta uma história social, e por possuir característica dinâmica que pode se perder.
5 Considerações Finais
Buscou-se analisar se a competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para a valorização do grafite como documento de arquivo e responder as seguintes problemáticas: a institucionalização do grafite pode ser considerado uma prática para quebra do paradigma cartesiano? A competência em informação e a teoria da complexidade podem contribuir para essa prática?
Por meio das discussões, pôde-se notar que a competência em informação, que estabelece que o sujeito deve identificar sua necessidade informacional, contribui para os grafiteiros conseguirem resgatar grafites já produzidos para servir de inspiração e construção de novos conhecimentos. O acesso efetivo e inteligente das fontes de informação propicia aos grafiteiros melhor preparo para elaboração da sua expressão informacional. Além disso, essa expressão quando institucionalizada, servirá de base para acessos externos de estudiosos e sociedade no geral.
O padrão que corresponde à necessidade de fontes confiáveis para acesso efetivo da informação, justifica e auxilia a ideia de institucionalização do grafite como documento de arquivo, visto que fornecerá um acesso padrão, libertador e duradouro à sociedade que decidir utilizar e acessar o grafite documentado em arquivos públicos.
A competência em informação assegura que uma pessoa competente em informação deve utilizar a informação e tomar decisões tanto individualmente como em grupo, pois isso gera fenômenos do compartilhamento e socialização da informação, que resultará em conhecimento. Esse fator pode apoiar no processo de institucionalização do grafite, visto que, a união de vários a favor desse acontecimento poderá transformar essa ideia em prática. Ademais, o grafite representa grupos de pessoas, e sua produção se dá por um ser cognoscente, carregado de interferências e induções de outras pessoas. Logo, a força desses processos está na união.
Quanto à análise da teoria da complexidade, notou-se que o princípio sistêmico e o princípio hologramático concordam que existem complexidades no processo do grafite, porque ao mesmo tempo que a importância dessa arte está no todo que ela representa para cada um, suas fragmentações relacionadas ao momento em que foram desenvolvidas também são pontos importantes de serem elencados. Logo, têm-se a consciência que o todo não exclui as partes, e nem as partes devem excluir o todo.
O terceiro princípio, indiretamente, reflete para o fato de que não há como escapar desse processo de institucionalização do grafite, justamente porque esse é um desenho da sociedade, é efeito de alguma causa e configura e denomina momentos da história de um país e de um povo. Se a história não pode ser apagada, tampouco o grafite como elemento dessa história deve ser.
Por hora, o grafite também se define como um processo de autonomia e superação do ser humano e concomitantemente é resistência contra a falta da liberdade de expressão, e isso é expresso no princípio de auto-eco-organização de Morin (2000). Logo, a institucionalização do grafite necessita ganhar força por uma luta que está começando.
Dessa maneira, verificou-se que aspectos da competência em informação e da teoria da complexidade podem auxiliar no processo de institucionalização do grafite como documento de arquivo e que esses aspectos possuem potencial futuro para contribuir para a quebra de um paradigma cartesiano que envolve esse assunto. Essa abordagem torna-se necessária para o fortalecimento da integração das partes que constituem o mundo. Tudo está interconectado e o papel do pesquisador torna-se incentivar essas inter-relações.
Por fim, como apoio ao desenvolvimento de pesquisas futuras, indica-se a realização de uma pesquisa de campo que envolve os temas inter-relacionados neste artigo, e que busque ouvir a população que recebe esses grafites, os produtores (grafiteiros) e os arquivos públicos.
Referências
ALBUQUERQUE, A. C. de. O grafite como canal alternativo de informações: caminhos para uma discussão interdisciplinar em ciência da informação. Revista de iniciação científica da FFC, v.4 n.3, 2004. Disponível em: Acesso em: 13 jun de 2017.
BELLUZZO, R.C.B.; KOBAYASHI, M.C.M.; FERES, G.G. Information literacy: um indicador de competência para a formação de professores na sociedade do conhecimento. ETD – Educação Temática Digital. 2004, v.6, n.1, p.81-99. Disponível em: . Acesso em 10 mai. 2017.
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Palavras-chave
Competência em informação; teoria da complexidade; institucionalização do grafite; arquivos públicos.