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O EFEITO DA MEDITAÇÃO NO CLIMATÉRIO
Gabriella Cavalcante Freitas, Amanda Oliveira Bernardino Cavalcanti de Albuquerque, Lucas dos Santos Maciel, Gabriel de Oliveira Mendonça Soares, Claudinalle Farias de Queiroz Souza, Aurélio Molina da Costa

Última alteração: 2021-07-10

Resumo


Introdução: O climatério é o período fisiológico de transição da idade reprodutiva à idade não reprodutiva entre as mulheres. Ele pode ser dividido em três fases: a perimenopausa, que equivale ao início das alterações resultantes da queda gradual dos níveis estrogênicos; a menopausa, entendida como o último período menstrual, decorrente do envelhecimento dos ovários; e a pós-menopausa.1 O período climatérico é marcado por sinais e sintomas como: alterações genitais (hipotrofia, secura vaginal, prurido), alterações vasomotoras (ondas de calor, conhecidas como fogachos), insônia e oscilações de humor, entre outros. Essas condições estão intrinsecamente ligadas às alterações endócrinas e, por isso, são comumente tratadas por meio da terapia de reposição hormonal, principalmente com estrógenos. Contudo, seu uso é questionável devido aos possíveis efeitos colaterais, como o aumento do risco de eventos tromboembólicos e de câncer de mama e endométrio. Além disso, tais sinais e sintomas se apresentam de formas e intensidades diferentes em cada mulher e, também, são influenciados por variáveis socioambientais, o que indica a necessidade de realizar abordagens terapêuticas individualizadas.2 Nesse contexto, as Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) apresentam-se como uma promissora alternativa às medidas farmacológicas no tratamento de mulheres que sofrem com os sintomas do climatério. Essas práticas visam à integração do ser humano com o meio ambiente e com a sociedade em que estão inseridos e têm como foco o indivíduo como um todo, abrangendo as esferas física, psíquica, emocional, social, existencial e espiritual, oferecendo vários potenciais benefícios à saúde de quem as pratica. Dentre as 29 práticas institucionalizadas pela Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS, tem-se a meditação, originada nas tradições orientais, principalmente a indiana, japonesa e chinesa, apresentada pelo Ministério da Saúde como uma prática que treina o foco na atenção, na diminuição do pensamento repetitivo e na reorientação cognitiva, promovendo uma maior integração entre mente e corpo, mudanças positivas no humor e melhora da atividade cognitiva, além de possuir um excelente perfil custo-benefício malefício. Portanto, esse contexto indica a importância de se realizar uma revisão sobre os possíveis impactos positivos da prática da meditação na saúde das mulheres climatéricas, particularmente naquelas que estão com sua qualidade de vida comprometida nessa fase de suas vidas. Objetivos: Entender quais os benefícios da meditação, considerada como uma PICS pelo Ministério da Saúde, nos efeitos do climatério. Metodologia: Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, método de estudo que tem sido apontado como uma ferramenta ímpar no campo da saúde, pois sintetiza as pesquisas disponíveis sobre determinada temática, permitindo uma prática assistencial fundamentada no melhor conhecimento científico existente. Para isso é necessário construí-la através de etapas: A primeira etapa consiste na formulação da questão de pesquisa que é “Quais os efeitos do uso da meditação no climatério?”. Na segunda, foram definidos os descritores que poderiam surgir em estudos que respondessem à questão de pesquisa. Os selecionados foram os seguintes: “Meditation” e “Menopause” com o operador lógico booleano “AND”. Foram considerados como critérios de inclusão: artigos nos últimos 10 anos (2011-2021), artigos disponíveis na língua portuguesa, inglesa e espanhola. A busca foi realizada a partir da Biblioteca Virtual em Saúde, no período de fevereiro e março de 2021, na seguinte bases de dados: Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline). Considerou-se ainda, como critério de inclusão, somente artigos com texto completo nas três línguas escolhidas. Foi construído um instrumento para a coleta de dados onde os artigos selecionados foram categorizados por título, ano, país, método, base de dados e principais resultados. Na primeira busca, foram encontrados 32 artigos. Após selecionar apenas aqueles que preenchiam os critérios de inclusão, o total diminuiu para 21 títulos. Após a leitura dos títulos e dos resumos foram selecionados 14 artigos que consideravam o objetivo e questão de pesquisa proposta. Após leitura dos artigos na íntegra, chegou-se ao total de 11 artigos. O preenchimento do instrumento foi realizado por dois revisores de forma independente, para extração dos principais aspectos abordados. Na interpretação dos resultados, seguiu-se a leitura comparativa entre os artigos. Desenvolvimento: O primeiro estudo selecionado, foi o “A Mindfulnessestá associada com insônia depois da menopausa?”, publicado em 2014. Nesse estudo os autores investigaram 26 mulheres no pós-menopausa, da cidade de São Paulo, Brasil, e que não estavam sob hormonioterapia. As participantes foram divididas em 2 grupos: 14 mulheres com insônia e 12 mulheres sem insônia ou qualquer outro distúrbio do sono. Para analisar o impacto da mindfulness foi usada a escala "Mindful Attention Awareness" e o formulário "Positive and Negative Affect Schedule-Expanded”, domínio atenção. Os resultados sugeriram que intervenções baseadas na meditação mindfulness podem ajudar no tratamento da insônia nas mulheres menopausadas.2 O segundo estudo selecionado, publicado em 2016, foi uma meta-análise sobre mindfulness, com o título "Mindfulness meditation for insomnia: A meta-analysis of randomized controlled trials", na qual foram incluídos 6 RCTs, com um total de 330 pacientes, a imensa maioria delas no climatério. As análises de subgrupos mostraram que embora não houvessem diferenças estatisticamente significantes entre os grupos em termos de tempo total de sono, efeitos significantes foram encontrados no despertar, na latência do início do sono, qualidade do sono, efetividade do sono, e no Pittsburgh Sleep Quality Index (PSQI). Para os autores, esses resultados sugerem que a meditação mindfulness pode melhorar moderadamente alguns parâmetros do sono e pode servir como tratamento auxiliar para pacientes com insônia.3 Já a metanálise publicada em 2017 investigou o impacto da meditação, meditação mindfulness, hipnose e relaxamento, nos sintomas vasomotores e na qualidade de vida relacionada à saúde em mulheres no climatério, baseando-se em 5  revisões sistemáticas e 6 RCTs. Os autores concluiram que não existe informação nova suficiente para conduzir uma meta-análise que fosse capaz de examinar o efeito da mindfulness e da hipnose nos desfechos de interesse. Mesmo assim eles afirmam que as várias intervenções de relaxamento e mindfulness não demonstraram efeitos nos sintomas vasomotores e na qualidade de vida.4 Também em 2017 foi publicada uma revisão sistemática procurando avaliar o efeito da mindfulness nas dores crônicas. Foram incluídos 13 ensaios clínicos randomizados, a enorme maioria com mulheres em faixa etária compatível com o climatério, que indicaram que a meditação reduziu, com significância estatística, depressão, dor afetiva, dor sensorial e ansiedade. Os autores também encontraram que a qualidade de vida, tanto no escore total quanto nos domínios saúde mental e saúde física, melhorou com a meditação mindfulness. Esses achados levaram os autores a afirmar que ela tem um proeminente efeito nos aspectos psicológicos do dia a dia das dores crônicas, melhorando a depressão e a qualidade de vida.5 Ainda  em 2017 outra revisão sistemática com metanálise investigou o impacto da meditação na redução do estresse, na pressão arterial e na insônia. Um total de 20 artigos foram incluídos neste estudo, com um total de 2912 participantes, das quais mais da metade era de mulheres, com idade compatível com o climatério. Na interpretação dos autores, os resultados sugerem um grande efeito nas medidas de ansiedade, depressão e estresse; e moderado efeito em controle emocional e qualidade de vida. Embora a heterogeneidade dos estudos limitar as implicações desses achados, os autores concluem que diferentes estilos de meditação foram efetivos na melhora, forte ou moderada, da depressão, ansiedade, estresse e qualidade de vida das participantes.6 Novamente em 2017, outra revisão sistemática com meta-análise investigou o papel da meditação com mantras, meditação mindfulness e da Ioga, tendo agora a diminuição da pressão arterial como desfecho principal das intervenções em pacientes com hipertensão arterial. Foram selecionados 13 estudos de uma amostra de 510 estudos num período de tempo de quase 70 anos, a maioria com participantes mulheres em idade compatível ao climatério. Os resultados indicaram que, principalmente a meditação, teve um papel notável na diminuição da pressão arterial dos participantes com mais de 60 anos de idade, enquanto a Ioga parece contribuir para essa diminuição nos participantes com menos de 60 anos. Os autores concluem que embora reconheçam as diversas limitações da investigação, a meditação e a Yoga são efetivas alternativas não farmacológicas em alguns casos.7 Como a insônia é um sintoma muito frequente em  mulheres no climatério, selecionamos outro estudo, publicado em 2018, sobre o impacto da meditação sobre a mesma, com a participação de 30 mulheres menopausadas em São Paulo. Em relação à qualidade de sono, qualidade de vida, níveis de atenção e redução dos sintomas vasomotores ,após intervenção com meditação mindfulness, os autores encontraram melhorias na qualidade do sono, uma redução na gravidade da insônia, uma melhor qualidade de vida, melhores níveis de atenção e uma redução dos sintomas da menopausa e vasomotores.8 Em 2019, foi publicada nova revisão sistemática com metanálise para avaliar a eficácia da meditação mindfulness no  tratamento da ansiedade, comparando-a com técnicas de relaxamento. Os autores selecionaram 14 RCTs com 862 participantes sofrendo com distúrbios de ansiedade ou com alto traços de ansiedade. Os resultados encontrados foram muito favoráveis à meditação, mas poucos estudos eram de alta qualidade o que pode ter influenciado os resultados. Para os autores, a meditação parece ser um pouco mais efetiva do que técnicas de relaxamento no tratamento da ansiedade e também ter efeitos mais duradouros. Entretanto, mais estudos se fazem necessários para avaliar o preciso potencial da meditação, quando comparada com técnicas de relaxamento, inclusive para evitar vieses dos pesquisadores.9 Foi publicada em 2019 uma revisão sistemática a fim de avaliar a efetividade da meditação mindfulness em disfunções sexuais femininas. Os autores incluíram em sua investigação 15 artigos, sendo 4 direcionados a analisar a eficiência da meditação mindfulnessem dores na região pelvicogenital e 10 focados em desordens do desejo sexual em mulheres; um estudo investigou seu impacto na disfunção erétil em homens. Os resultados sugerem que a meditação, avaliada subjetivamente, leva a uma melhora do desejo e na satisfação sexual e a uma redução do medo de atividade sexual, mas não na redução da dor durante as atividades sexuais. Entretanto, os autores realçam as limitações dos estudos, embora sinalizem que os resultados são promissores e que a meditação mindfulness deve ser implementada pelo seu potencial de redução de sintomas de disfunção sexual.10 Ainda em 2019, um novo estudo foi publicado no qual foi analisado os efeitos da prática meditativa mindfulness na sintomatologia (ansiedade, depressão e distúrbios do sono) de mulheres climatéricas, na cidade de Guangzhou (Cantão), República Popular da China. Antes e após a intervenção, 121 mulheres na perimenopausa foram analisadas através de uma autoavaliação de ansiedade (Self-rating Anxiety Scale) e depressão (Self-rating Depression Scale). A qualidade do sono foi avaliada pelo Pittsburgh Sleep Quality Index. Os autores concluíram que ela pode aliviar sintomas de depressão e ansiedade, melhorar qualidade do sono e saúde mental, além de indicar que frequência de prática e remissão dos sintomas se correlacionam positivamente.11 Finalmente, selecionamos um estudo observacional, de corte transversal realizado em Cheonan, na Coreia do Sul, publicado em 2020, sobre o efeito da meditação no alívio dos sintomas (humor depressivo ou irritabilidade) e na bioquímica do sangue (glicose e colesterol HDL), alterações que são consideradas frequentes no climatério, em 65 mulheres que foram divididas em 2 grupos: 33 que eram praticantes de meditação e 32 não praticantes como grupo de comparação. Embora o grupo que fazia meditação tenha tido melhores resultados (estatisticamente significantes) os autores realçam a necessidade de estudos com melhores desenhos para comprovar os benefícios da meditação.12 Consideração: Com exceção de um artigo, a literatura científica relata uma gama de benefícios gerados pela meditação em mulheres no período climatérico como, por exemplo, nos distúrbios do sono, na bioquímica sanguínea, irritabilidade, humor depressivo, dor, disfunção sexual, ansiedade, melhorando direta e indiretamente a qualidade de vida dessas mulheres. Entretanto, é relevante ressaltar que a quase totalidade dos artigos indica a necessidade de melhores estudos, tanto em termos de desenho quanto do número de participantes. Mesmo assim, nos parece importante que os estudantes e os profissionais de saúde, particularmente aqueles que trabalham com esse público específico, isto é, mulheres climatéricas, conheçam o potencial de benefícios da meditação e das práticas integrativas e complementares, que possui excelente perfil custo-benefício-malefício.

Referência Bibliográfica

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Fomento:


Palavras-chave


Meditação; Climatério; Terapias Complementares.